Apesar das mazelas sociais que marginalizam boa parte da população brasileira e a carga de tributos que inflige à classe média uma penosa condição de sobrevivência, o brasileiro em geral parece despreocupado com sua realidade a ponto de dar-se o privilégio de dedicar sua vida ao acompanhamento do enlatado holandês Big Brother Brasil. A lavagem cerebral promovida pelo mencionado programa faz com que as pessoas se sintam "privilegiadas" por acompanharem em tempo real um programa que, conforme frases coletadas na sociedade, é "inteligente, inigualável, antropológico".
Uma televisão, um computador conectado à internet e se pode fazer parte de um movimento nacional de orientação comportamental, que inclui padrões estéticos, sexualidade e hábitos lingüísticos. No BBB, sobretudo os jovens, buscam identificar em que personagens do reality show suas referências são acolhidas. Daí por que os homossexuais e outras minorias são ridicularizados.
O brasileiro é, historicamente, alienado da realidade do país. Com memória curta para qualquer coisa de mínima importância, nulidade motivacional para se organizar em torno de reivindicações e vocação para se exceder em festas desorganizadas, o cidadão brasileiro reclama sem conhecimento de causa e age em escassez. Uma grande massa de brasileiros está encarcerada em uma política cruel, promovida por grandes conglomerados econômicos, de alienação profunda da sociedade brasileira, sobretudo dos jovens, que em tese representam o nosso futuro. A Rede Globo de televisão impõe à infância de grande parte dos brasileiros ídolos como Xuxa Meneguel e Angélica. Com o esvaziamento de tais figuras, a poderosa emissora busca novos atores para desempenhar o papel de orientadores comportamentais. O Big Brother, assim, exerce esse papel de colocar sob os holofotes novas imagens que possam direcionar o comportamento dos jovens do País, desviando-os de assuntos mais relevantes.
A política do "pão e do circo" cai como uma luva nas mãos dos grupos oligárquicos dominantes. Grande parte da população, apesar de viver em condições precárias, se encontra de tal forma alienada, inclusive pela precariedade educacional e por desespero, que medidas assistencialistas tomam grandes proporções a ponto de alçar Lula a uma condição privilegiada nas pesquisas de intenção de voto. A elite não precisa do pão, porque assiste a Big Brother Brasil degustando um saboroso caviar. O circo é o entretenimento diário. Milhões de votos por telefone e pela internet para a escolha do "emparedado", do líder da semana e do eliminado, o que recheia os bolsos da grande patrocinadora do besteirol e de seus anunciantes.
E assim correm pelo Brasil os comentários relacionados com as intrigas diárias promovidas pelos participantes do programa. A brasilidade exposta à exaustão com pitadas grotescas de alienação política e cultural - assuntos completamente esquecidos -, exaltação de atributos físicos, ganância, egoísmo, falsidade e manifestações racistas contra minorias. Ao observarmos o dia-dia da casa do BBB, a imagem de povo educado, receptivo e lutador se desmancham na conveniência de buscar meios fáceis de mudar a vida e nos métodos para a realização de tal intento.
Portanto, abrilhantar a jornada dos 12 ocupantes da casa, sob o argumento de luta para transpor as barreiras da vida e das armadilhas de seus adversários, é fazer apologia ao comodismo, ao egoísmo, à falsidade, à traição e à mentira – ainda mais que muitos que entram na casa não necessitam do prêmio de 1 milhão de dólares para continuar vivendo de forma confortável. O programa dá, sim, vazão a aproveitadores de plantão que vêem no enlatado um meio de se tornar um milionário ou no mínimo de aparecer em cadeia nacional. Ao invés de oferecer ao mais hábil manipulador um milhão de reais, a Rede Globo poderia repartir o montante entre milhares de brasileiros que sequer possui um aparelho de televisão para apreciar as lindas beldades selecionadas. Ou então, no mínimo, a poderosa Rede Globo poderia optar por um formato educativo de reality show, com o recrutamento e seleção de jovens estudantes que, após uma maratona de provas de desempenho, poderiam ganhar bolsas escolares ou universitárias.
Porém, é mais seguro deixar o povo brasileiro imerso na alienação profunda – o que assegurará a manutenção do poder dos grandes grupos oligárquicos – a fazê-lo pensar e refletir sobre a sua condição pessoal e de seu país. Esses grupos dominantes esperam a disseminação desses aproveitadores de momento para que o egoísmo e o individualismo cada vez mais segreguem a população e, dessa forma, não haja possibilidade de um levante social ante a realidade imposta.
FONTE: Oliveira, Artur. Observatório da Imprensa; 2006
sexta-feira, 19 de março de 2010
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